Por conta de um erro médico em um parto não humanizado, uma mulher moradora de Itabuna, no sul da Bahia, será indenizada em R$ 30 mil. O dia deveria ser o mais feliz de sua vida, mas foi marcado por fortes dores. O parto aconteceu em abril de 2019, na Santa Casa da Misericórdia de Itabuna. Na ação, ela conta que, após sentir as dores do parto, foi para o hospital para dar luz ao filho. Ela foi levada para a sala de pré-parto e a bolsa foi rompida artificialmente com o dedo da médica de plantão.
Após o nascimento, a criança foi levada para a realização dos procedimentos padrões e a mãe solicitou que uma acompanhante observasse o bebê para evitar trocas na maternidade, ficando aflita com a situação. Ela diz que, logo depois do parto, foram colocadas algumas gazes em sua vagina e que foi levada, em cadeira de rodas, para a sala de sutura. Após o procedimento, a mulher foi encaminhada para descanso na enfermaria, sendo visitada pela obstetra somente no dia seguinte ao parto. Apesar de narrar dores e desconforto na região da sutura, com muita ardência, e idas constantes ao banheiro para urinar, ela teve alta.
Foi dito que aquelas dores eram normais pelo pouco tempo de parto. Os dias seguintes em casa foram de muitas dores, com ardência e dificuldade de ficar em pé sem se apoiar nas coisas, sentindo um grande peso na região da vagina. Na petição, ela contou que sentiu uma “bola” na região, e posteriormente, passou a ter febre. Ela retornou ao hospital, sendo atendida por uma “excelente médica”, que ao lhe atender fez uma “cara de reprovação” ao encontrar gazes na vagina da autora, em cor preta, com odor muito forte.
A médica a mandou fazer força para expelir a “bola”, que era, na verdade, sangue coagulado. Após expelir o sangue coagulado, a mulher sentiu um alivio imediato. Ela pediu indenização por danos morais pelas dores que sentiu. Em sua defesa, a Santa Casa da Misericórdia afirmou que “o parto vaginal provoca, via de regra, uma ruptura no períneo, exigindo que após o nascimento seja feita uma sutura no local, o que efetivamente ocorreu, conforme noticiado na inicial” e que a autora “apresentava um sangramento uterino excessivo, exigindo que fosse colocado um tamponamento que seria retirado em momento posterior”.
Disse que antes da sutura foi aplicado um anestésico e que é inverídico que a enfermeira tenha sido grosseira com a parturiente. Sustentou que o “tamponamento não foi retirado logo após a sutura para evitar que o sangramento continuasse, restando certo, contudo, que a paciente autora deveria ter sido reexaminada durante sua permanência no hospital, e, tão logo constatado que o tamponamento havia cumprido seu papel – de fazer cessar o sangramento – promover sua retirada, o que, infelizmente, dado um grande número de parturientes naquele dia, não foi realizado”.
A unidade defende ainda que, apesar do ocorrido, não pode ser responsabilizada pelo fato, e nem indenizar a parturiente. Segundo o juízo de piso, o pedido da autora versa sobre um atendimento “não humanizado” e por erro médico pelo “esquecimento” da gaze no canal vaginal. “Analisando-se a contestação apresentada, constata-se que o ‘esquecimento’ da gaze no canal vaginal da autora é incontroverso, sendo, assim, desnecessária qualquer maior consideração acerca deste fato, bastando, portanto, a análise, apenas, da consequência indenizatória pretendida pela autora”, diz a sentença. Uma testemunha contou que o parto, na verdade, foi realizado por duas enfermeiras, pois a médica deixou a sala mesmo com a mulher em trabalho de parto. A testemunha conta que ouviu uma das enfermeiras contando para a médica que o parto havia ocorrido e que a médica teria dito que estava tudo bem, assinando os papéis do nascimento.
Também contou que, por várias vezes durante o parto, a parturiente falou que estava com fortes dores, sendo ignorada. Declarou que sentiu descaso no atendimento, não deixando a mãe ver o bebê logo depois do nascimento. “A questão do trato humanizado, não só na relação médica, mas em todos os tipos de atendimento, é sobremaneira subjetiva, não havendo, assim, critérios objetivos para aferir a sua presença ou não. O ser humano é muito diferente, cada um com uma característica própria, nem sempre podendo se qualificar como desumano uma pessoa que, por exemplo, apresenta-se séria, deixando de demonstrar uma atenção mais afetuosa.
Por óbvio, sabe-se que o parto deve ser um dos momentos mais especiais da mulher, merecendo, por isso, uma atenção bem especial dos profissionais que estejam com ele envolvido. Todavia, também não é possível ignorar que os profissionais da saúde, envolvidos com diversos procedimentos, às vezes, se esquecem de prestar uma atenção mais particular, dadas diversas circunstâncias, dentre as quais, o volume de trabalho”, assinalou na sentença. Ainda na decisão, o juízo asseverou que o “esquecimento” de gaze dentro do canal vaginal deve ser reparado pelo dano moral e, por isso, determinou que a Santa Casa da Misericórdia indenizasse a autora em R$ 10 mil.
Diante da sentença, a autora recorreu para elevar a indenização. O recurso foi relatado pela desembargadora Lígia Ramos, da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA). Para a desembargadora, o valor deve ser “mais condizente com os fatos e provas dos autos, capaz de indenizar o desgosto, o constrangimento e os demais sentimentos negativos experimentados pela autora em razão desta conduta”. Ao elevar a indenização para R$ 30 mil, a desembargadora salientou que o valor é mais adequado diante dos danos sofridos. (Cláudia Cardozo-Só em Ilhéus)
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